Há anos tenho lido matérias jornalísticas descrevendo histórias de mulheres que sofreram agressões físicas, verbais e psicológicas durante o parto. Tais agressões provocaram sofrimento, dor e lesões nas mulheres e nos bebês que estavam nascendo. Histórias de falta de profissionalismo. Deboche. Negligência. Humilhação. Gritos. Sadismo. Tortura.
Histórias de traumas. Lesões irreversíveis.
Morte.
Num país cheio de homens e mulheres que vomitam o discursinho calhorda de "proteger as crianças", que põe vagas de gestantes em estacionamentos (para incentivar as classes proprietárias de automóveis a procriarem? Na Europa não tem essa bobagem), proíbe o aborto e recusa a laqueadura, não é um contrassenso maltratar mães e bebês?
Quem pratica violência obstétrica odeia e quer destruir mães e bebês.
Vocês duvidam?
Mulher em trabalho de parto, mas sem dilatação. Médica debocha da paciente, recusa-se a ministrar-lhe anestesia, a fazer cesariana, grita com a paciente e ordena à enfermagem que a "largue". Paciente tem que esperar pelo próximo plantão para não morrer junto com a criança.
Paciente chega ao hospital e recebe doses maciças de ocitocina. Tem contrações sem intervalo, e médica recusa-lhe anestesia, além de acusá-la de fraca. Médica diz para a paciente que, se ela morrer, será enterrada, e que a morte é muito natural para os médicos.
Enfermeira fala alto que mães jovens são fracas e cesariana é para fracas. Médicos dizem que a paciente não está em trabalho de parto. Ela tem que esperar dois plantões até vir um médico e fazer uma cesariana de emergência. Bebê nasce em sofrimento.
Médicos fazem episiotomias não solicitadas em pacientes, que é um procedimento machista, corte cirúrgico feito na região entre a vagina e o ânus, durante o parto, para facilitar a saída do bebê. Isso exige sutura posterior. Por que não uma cesariana, ao invés de um corte tão incômodo e agressivo para a mulher, com altos riscos de sequelas, como incontinência urinária?
O pior foi saber que há médicas e enfermeiras entre os perpetradores.
Aqui não tem essa de "sororidade" não: mulheres que praticam violência obstétrica são tão sádicas, bandidas e machistas quanto os homens que a praticam.
Violência obstétrica tem que ser enquadrada na Lei da Tortura - Lei 9455/1997, omissa quanto à discriminação contra as mulheres como causa da tortura.
Porém, em 2019, o Ministério da Saúde do Brasil, com base no Parecer CFM n° 32/2018, defenestrou o termo “violência obstétrica” de documentos de políticas públicas. O Parecer CFM 32/2018 refere-se depreciativamente aos movimentos feministas.
Realmente difundiu-se entre os movimentos feministas uma ideia fixa sobre como "deve ser" o parto: vaginal. Ora, isso é o CONTRÁRIO do Feminismo, doutrina pela liberdade das mulheres, jamais por sua tutela.
A Deputada estadual Janaína Paschoal foi muito criticada por criticar a ditadura do parto normal, tendo apresentado um projeto pelo qual as mulheres poderão optar pelo procedimento cirúrgico independentemente de indicação médica, sancionado pelo Governador de São Paulo.
A ditadura do parto normal, inclusive, fomenta várias ocorrências de violência obstétrica.
O motivo dado pelo CFM para rejeitar a expressão violência obstétrica é que ela "ofenderia" os obstetras.
A violência obstétrica e a ditadura do parto normal, assim como a da amamentação, são facetas de um mesmo mal: o machismo.