Wednesday, February 29, 2012

PERIGUETES E SENHORITAS

Vejam estas definições:

se.nho.ri.ta
[Senhora + -ita1.]
Substantivo feminino.
1. Moça solteira.
2. Tratamento respeitoso dado a senhorita


(1). pe.ri.gue.te
[Perigo + -ete.]
Substantivo feminino. Bras. Gír.
1. Moça ou mulher namoradeira, mas sem namorado.

Fonte: Dicionário Aurélio



A mesma pseudo-lógica chauvinista que inventou o "senhorita", inventou também o "periguete", só para humilhar as mulheres "sem homem".


Machismo jamais é respeitoso, logo, "senhorita" nunca o foi e não o é.


Há quem diga que as mulheres de hoje "não se dão ao respeito" e que, no passado, os homens as respeitavam mais.

É enganosa a suposição de que, antigamente, as mulheres eram mais respeitadas.

O Código Civil de 1916 realmente era muito "respeitoso" ao estabelecer que o defloramento pré-nupcial motivava a anulação do casamento, a deserdação da filha por "desonestidade", entre outras patifarias.
O machismo adora inventar adjetivos que menosprezam as mulheres, enaltece indevidamente as casadas ou "com homem" (não são melhores, tampouco mais dignas de respeito do que as "sem homem", EM NADA).


A definição de "periguete" é horrenda. "Moça namoradeira, mas sem namorado". O problema é não ter um namorado? A mulher, pelo jeito, para ser "respeitável", precisa de um palhaço de gravatinha a quem responder "sim, amo!" Como a Jeannie, lembram? (O Major Nelson pelo menos era bonitinho, mas fã de uma garrafa)


Pior, impossível.

Adjetivos que marginalizam a mulher "sem homem": manifestações de mau-caratismo, nada mais.


São absolutamente odiosas e devem ser destruídas todas as distinções sociais entre as mulheres, baseadas no seu estado civil e no seu comportamento sentimental e físico; sobretudo, entre a solteira e a casada, a só e a acompanhada; essa discriminação é tão humilhante, nojenta e merecedora de lei incriminadora quanto o racismo.


A deferência dada às esposas, companheiras, noivas e namoradas não encontra lógica nenhuma que a sustente; nada mais resulta do que do baixo e vil interesse dos homens (e das mulheres que creem possuí-los) em obter um valor que não têm e desencorajar a liberdade de escolha das mulheres sós, de recusar os homens que não as agradem, mas de lutar por aqueles que as agradem em cheio.


"Senhorita" é odioso, "periguete" idem, porque toda discriminação o é. E o controle social sobre a afetividade e a sexualidade da mulher não passam de manifestações de atraso e desinformação.


O homem, solteiro ou casado, é sempre senhor, faz o que bem entende e sempre sai "machão" e"limpinho" de qualquer imundície. Inventou o casamento para ter uma fulana "oficial" com quem desfilar (e mostrar para todo mundo sua pretensa virilidade), mas, como é um tremendo de um hipócrita, permite-se "as outras", com as quais se esconde e não desfila, e ainda as cobre de nomes feios, porque não têm "dono".


A mulher e "os outros": ai, ai, ai!
Sinal dos tempos: as mulheres ganham seu sustento e podem (infelizemente, em termos) escolher os homens que quiserem, ou não escolher nenhum (sim, isso, nós podemos). Os primatas reagiram sem demora: mulheres, atenção, se ficarem sem um homem, nome feio em cima de vocês!


"Periguete" é só um dos muitos nomes feios inventados com essa estúpida finalidade.


Mau caratismo, nada mais. É o que penso do abjeto "duplo padrão moral" que inferniza as mulheres, sobretudo as "sem macaco".


Aliás, é abjeta, odiosa, excludente e opressora a sacralização do casamento, das relações "estáveis" e a demonização de todas, e de todos, que desejem ou lutem alguém de quem gostem. E é claro que essa demonização atinge sobretudo as mulheres solteiras.


Vivemos num Estado laico e temos que destruir a moral de inspiração religiosa, que reprime o ser humano, condena as relações, demoniza a mulher e o homem dissidentes e faz da vida um inferno.


Wednesday, February 08, 2012

A MÍSTICA DA FAMÍLIA

Vocês já repararam que todos supervalorizam a família?
É Família Cristã, é célula primordial da sociedade, é família nuclear, família estruturada, família feliz, proteção da família, e por aí vai.
Alguém já parou para pensar no quanto essa conversa é preconceituosa e antiquada?
A Constituição, que tanto defendo, nem ela, coitada, ficou livre dessa ideologia que ressumbra a instituições do século retrasado. Põe a família acima de tudo, determina que contará com "especial proteção do Estado", mas pelo menos acabou com a modorrenta chefia da sociedade conjugal pelo marido, lixo previsto no Código Civil de 1916, flagrantemente atentatório à igualdade de sexos, prevista em todas as constituições brasileiras desde 1934. Mas nossos tribunais, machistas e tíbios, não estavam nem aí. Inventavam sofismas de má-fé para afastar a Constituição e fazer prevalecer a lei civil de então, invertendo a hierarquia das normas.
Mas não é boa a valorização da família?
Não. Não desse jeito. Não com essa mística, que sobrepõe a família ao cidadão, ao indivíduo.
Quem são os maiores sacrificados nessa história? Os solteiros.
Famílias e casais são melhor tratados em lugares públicos do que solteiros. Sábado fui a um restaurante em Brasília, o Oscar, com uma amiga. Além de nós duas, havia dois homens jantando juntos e o restante dos presentes, casais ou turmas. Para mim, foi notória a negligência com que fomos tratadas pelo garçom que nos atendeu a maior parte do tempo, de forma antipática.
E os homens que estavam lá? Bem, com os homens é sempre diferente. E, no caso, um deles era senhor de alta expressão.
O restaurante também não passou no teste da etiqueta democrática e republicana.
É ABOMINÁVEL essa supervalorização da família e do casal. Famílias e casais não são EM NADA melhores do que pessoas sozinhas. Qual o fundamento lógico da maior consideração que recebem? NENHUM.
E o Poder Público não deveria, jamais, curvar-se à essa mística, que nada mais faz do que fomentar um preconceito. Antes, tem obrigação de combatê-lo.