Monday, March 19, 2007

Literatura para Moças

Vira-e-mexe, ouço a infeliz expressão, utilizada a fim de desmerecer o trabalho e/ou seu autor.
Porém, toda boa literatura é ou foi "literatura para moças".
Como Machado de Assis ficou famoso? Só sendo lido por homens? Oh, não! As mulheres letradas do séc. XIX, como não participavam da vida pública, eram ávidas consumidoras de literatura. E Machado retratava a vida como ela era, o que podia ser encantador e libertador. Afinal, era um alívio, para as mulheres, verem que, se cometiam adultério, não tinham que se atirar sob um trem por conta disso, como uma Anna Karenina. Lobo Neves, o "ministro" da ambiciosa Virgília, nunca descobriu que ela pulava a cerca com o Brás Cubas das Memórias Póstumas... Bentinho desconfiou, mas nunca teve certeza dos chifres que lhe pôs Capitu. Drástico, separou-se dela. Que moça esperta não gostava de um escritor assim? (Vou reler todos os livros do Machado e inspirar-me em suas "heroínas" a fim de dar nó na cabeça dos homens!)
Freqüentemente, tacham de "literatura para moças" os romances que falam de amor e de paixão. Porém, se isso for um demérito, então, os homens são incapazes de amar e devemos todas nos tornarmos lésbicas...
Yeats é "literatura para moças"? Tolstói? Stefan Zweig? Stendhal? Todos eles, em um ou alguns de seus livros, escreveram sobre grandes amores.
Já ouvi dizerem que "O Morro dos Ventos Uivantes" é "literatura para moças", só porque foi escrito por mulher e conta a saga de um grande amor... Mas a Brontë é reeditada, sua história teve três versões cinematográficas e ainda há quem duvide de seu talento. Muito bem. Li o livro no original inglês e tenho a dizer o seguinte:
A história foge ao padrão do "baixo romantismo" das novelinhas de televisão, das personagens lineares e da nítida divisão entre os "bons" e os "maus". Além de contar a saga de um grande amor, Emily Brontë nos fala de inveja, ciúme, ódio, revolta, força de vontade, vingança e do que um grande buraco, uma ferida na alma, é capaz de fazer. O casal protagonista não é "santo"; ambos têm múltiplas características de personalidade, pois são capazes de amar, de odiar, de fazer o bem e o mal. O rival de Heathcliff não é um vilão. E Brontë nos traz um precioso retrato da Inglaterra rural daqueles idos, documentando inclusive uma fala regional através do personagem Joseph. Quem nos narra a história, ademais, são duas personagens diferentes, ambas secundárias.
E ainda dizem que isso é "literatura para moças"...

1 comment:

amadreperola said...

Eu assisti no Futura a última versão para o cinema de o morro dos ventos e estou anciosa para ler o livro que sairá como classico pela editora abril. Imperdivel por conta do preço também.A história é instigante! Att Aline